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És_criativo(a): atividade de escrita

Partilha de textos

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Partilha de textos

Lembranças

28.02.22

I

Ainda me lembro...

O dia estava lindo, o teu cabelo negro sobressaltava-se com a luz do sol que nele embatia. Estavas com a t-shirt que sempre usavas, quando íamos à praia, os calções pretos, as sapatilhas da Nike e os teus típicos óculos de sol que te forneciam um ar de turista naquela tarde de verão. 

Ainda me lembro do teu sorriso caloroso a preencher a minha mente nos dias frios de inverno, dos teus olhos reluzentes cor de avelã a cruzarem-se de repente com os meus, da tua forma desajeitada que de alguma forma oferecia uma pitada de confiança ao teu ser. 

Ainda me lembro de te amar freneticamente, das flores que das árvores estavam a emergir, de te querer constantemente sempre que passavas por mim ao anoitecer. 

Ainda me lembro das folhas a servirem-nos de tapete no dia em que não pude afirmar mais como meu aquele que amarei eternamente. 

II

Sou cativa dos teus sentimentos. Sou escrava da tua alma impiedosa que me deixa a sofrer até ao âmago do meu ser. Sou prisioneira desse teu ser irrepreensível que me trucida mais e mais a cada dia que passa. 

Ainda me lembro de te ver com uns olhos que já não são mais os meus. Era verão e o brilho do sol sobressaltava o teu cabelo tão negro... Eu estava ao longe, sentada numa pedra. Lembro-me de passar horas só a olhar para ti, para a tua forma delicada e desajeitada que de algum modo - que até hoje não compreendo - ofereciam uma certa confiança ao teu ser. Lembro-me do teu sorriso caloroso que preenchia a minha alma, do teu rosto delicado, dos teus abraços que me davam a sensação de pertencer a algum local...  E os teus olhos... os teus olhos, essas portas para os teus pensamentos mais íntimos que eu sempre quis perceber...

 

Ana Araújo.png

 

Águas de sangue

24.02.22

"Assim como Gonçalo Ramires se inspirou na história da sua família, imagina que tu também tens de escrever uma história de um teu antepassado."

Corria 1879. Vitória nasceu sobre as águas do Douro. Se pensarmos bem, é um local incomum para se nascer, porém, também esta recém-nascida o era, de certa forma. Cresce e torna-se uma mulher espantosamente bela. Tinha cabelos negros, uma pele de porcelana e uns olhos de um castanho tão puro que muitos afirmavam ser quase vermelhos. Todos os que a conheciam amavam-na. Era carinhosa, doce, alegre, elegante e muito confiante, no fundo, era tudo o que se pretendia para uma noiva na altura. 

Vitória andava sempre rodeada de crianças. Pediam-lhe que lhes lesse um dos livros que ela constantemente carregava consigo e ela não recusava. No fundo, sempre teve uma vida agradável, até uma madrugada de 1897.  

Era um dia frio de inverno e Raúl, o seu pai, fez um estranho pedido a Vitória. Pediu-lhe que o seguisse até junto do rio, relativamente próximo de casa. Ela obviamente não recusou, e muito menos, pelo tom apressado que notou na voz de seu pai. Por fim, apressados, dirigem-se ao local. A menina de olhos vermelhos dá ênfase à sua suposição, de que algo estaria mal, após ver o seu pai sorrateiramente a escapulir-se por entre o arvoredo e a chorar silenciosamente. Vitória tenta segui-lo, mas é tudo em vão pois alguém a estava a agarrar, eram dois homens fortes e altos.  

O que estaria a passar pela cabeça de Vitória é para mim e para toda a minha linhagem, que conta esta história, um segredo. Sabe-se, somente, que, segundo bocas alheias, Raúl estava metido numa pesada dívida e que esta fora a última oportunidade que teve para recomeçar uma nova vida, deixando uma filha de forma tão cruel. 

E foi cruel de facto, pois, pelo que sei, esta menina tão pura acabou por morrer naquela mesma madrugada de inverno, afogada nas águas do rio que a vira nascer, espelhando uma visão de céu de sangue dela e de mais dois homens. 

Ana Araújo.png

 

A segunda cor do passado

23.02.22

"Gonçalo Ramires renasce como personagem e vai à Torre..."

Via... via e já antes ela me tinha despertado um sabor que parecia já ter provado. De dia, leva-me ao acaso de lembrar, não sei por que razão, as banalidades juvenis que já vivi. Chega-me à memória uma certeza de uma incerteza de que já por lá passei. Mas, de noite... de noite faz-me recordar o presente, um lugar sombrio, frio. A verdadeira certeza de que já presenciei isto recorda-me um sítio semelhante, coberto de ervas, arbustos, animais, um espaço que, por mais silencioso que fosse, deixa transparecer que é partilhado por alguém.

O dia traz-me recordações memoráveis, estranhas, mas não de todo desagradáveis. Penso que mudar algo na estrutura mudará o seu clima. Arrasto e limpo todas as ervas ao seu redor. Movo o que há dentro e dou-lhe uma nova cor... melhora apenas um pouco. Tem uma nova cor, mas o que era clássico pinta-se de moderno. É estranha a sua adaptação porque o exterior continua o mesmo. Um misto entre presente e passado, mas sei que o interior a nada se assemelha.

Passam tempos e eu apercebo-me de que as casas espelham a vida humana. Os olhos só veem o que são capazes de ver, muitas vezes, movidos pela ignorância de julgar pelo aspeto entristecido ou sorridente, pela beleza ou pela tristeza. Mas não são capazes de ver, devido à cegueira da estupidez, o que realmente transpira magia... o interior. É ela a chave da concretização humana. Portanto, é indiferente achar algo por achar sem reconhecer o seu valor. Como a mim a Torre me transmitiu negatividade, tornei em mim acolhedor o seu interior.

Não julgues... conhece.

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